DECISÃO/OFÍCIO nº 1756 / 2016 - CGJUS/CPANRCGJUS
PROCESSSO SEI Nº 16.0.000003871-0
ORIGEM: CONTROLADORIA DAS COMARCAS
ASSUNTO: RECONHECIMENTO DE FIRMA EM DOCUMENTO COM DATA POSTERIOR
REQUERENTE: RENATA RUAS DEVEZA - GERENTE BANCO DO BRASIL S.A.
REQUERIDO: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Trata-se de reclamação recebida na controladoria das comarcas, formulada por Renata Ruas Almeida Oliveira Tameirão Devêza em desfavor do 2º Tabelionato de Notas de Palmas, onde requereu que fosse reconhecida assinatura no instrumento particular de rescisão de contrato de locação, no qual figuram como partes o BANCO DO BRASIL e COMPANHIA BRASILEIRA DE DISTRIBUIÇÃO.
Alega a reclamante que o 2º Tabelionato de Notas Palmas se recusou a proceder ao reconhecimento da assinatura do representante do Banco do Brasil uma vez que o documento continha data posterior ao dia em que foi solicitado no balcão.
Foram os autos remetidos à Diretoria do Foro da Comarca de Palmas para apreciação em razão da competência originária do Juiz Diretor do Foro, conforme a previsão do art. 42, inciso I, u, da Lei Complementar Estadual nº 10/96.
A Corregedora Permanente, em sua decisão, entendeu que não cabe ao Tabelião ou ao Registrador examinar os pormenores relativos à determinação do prazo de vigência do contrato, e daí extrair que há uma suposta simulação, o que deverá ser questionado em via jurisdicional própria, transbordando das funções notariais a análise das questões relativas à eficácia, vigência e validade dos documentos particulares submetidos à simples reconhecimentos de firmas de seus signatários. Os efeitos contratuais, em caso de controvérsia, devem ser apreciados na esfera jurisdicional competente, refugindo do âmbito das atribuições notariais e da competência da Corregedoria Permanente.
Porém, ao buscar a posição dos demais Tribunais quanto a matéria reconheceu que há grande divergência entre as Corregedorias da Justiça dos tribunais estaduais brasileiros, existindo orientações em diversos sentidos, havendo Corregedorias que proíbem tal espécie de reconhecimento de firma expressamente e outras que entendem haver permissivo legal para tanto.
Portanto, no caso concreto, autorizou o reconhecimento da assinatura, conforme requerido, orientando, todavia, à Tabeliã que utilize modelo de etiqueta similar à empregada pelo Tribunal de Justiça do Maranhão e instituído pelo Provimento nº 10/2015 daquele Estado, devendo assim constar nos reconhecimentos pós-datados no próprio documento:
“Certifico que, neste ato de reconhecimento de firma ou de autenticação de documentos que as partes consentiram expressamente sobre a pós- datação, para o respectivo dia (__), mês (__) e ano (__). Palmas, ___/___/2016.”
No entanto, ante a ausência de normativa expressa da Corregedoria Geral da Justiça deste Estado, a Diretora do Foro encaminhou os autos a este órgão para verificação da necessidade de normatização ou uniformização da matéria.
Por força da Decisão nº 1538 / 2016 - CGJUS/ASJECGJUS a matéria foi proposta em pauta e apreciada pela Comissão Permanente de Assuntos Notariais e Registrais e submetida na 6ª reunião ordinária realizada na data de 18/11/2016, na qual compareceram todos os membros.
Em seu voto, o relator, Oficial Emanuel Acaiaba reis de Sousa, defende que:
O ordenamento jurídico pátrio estabelece que é nulo o negócio jurídico simulado, dentre outros motivos, quando os instrumentos particulares forem antedatados ou pós-datados, é o que pode ver no art. 167, §1º, III do Código Civil in verbis:
“Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.
§ 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: (...)
III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.”
O reconhecimento de firma é ato através do qual o Tabelião atesta que a assinatura constante do documento sob análise formal corresponde àquela da pessoas que a lançou, seja por semelhança ou por autenticidade.
Trata-se de ato de reconhecimento cuja eficácia gira em torno da conferência aos aspectos formais do ato jurídico praticado, não interferindo no teor do próprio negócio jurídico. O artigo 7º do Provimento nº 06/2006 da Corregedoria Geral da Justiça do estado do Tocantins dispõe sobre a impossibilidade de se efetuar o ato de reconhecimento de firma em documento sem data incompleto, ou que contenham, no contesto, espaços em branco. In verbis:
“art. 7º - É vedado o reconhecimento de firma em documentos sem data, incompletos ou que contenham, no contexto, espaços em branco.”
Não obstante a Consolidação Normativa não vedar expressamente o reconhecimento de firma em documento com data futura, revela de forma clara a sua preocupação com os aspectos formais do documento. Notadamente porque a atuação do Serviço notarial ao reconhecer a firma, dado o seu importante papel no sistema jurídico vigente de velar pela legalidade e segurança jurídica, acaba por emprestar uma maior certeza acerca da validade formal daquele ato.
Razão pela qual se veda o reconhecimento de firma em documento sem data, incompleto ou com espaços em branco. No caso do documento pós-datado, o reconhecimento de firma levará à contradição formal do documento, diante da não coincidência entre a data do documento e a data em que se praticou o ato notarial. Veja-se que, passado algum tempo, a análise formal do documento há de inspirar, aos olhos dos destinatários do documento, certa estranheza quando se deparar com o ato jurídico presumivelmente praticado em determinada data, porém constando, antes mesmo, o reconhecimento de firma nele lançada.
Essa apreciação formal pode, inclusive, levantar eventual suspeita de fraude. Ou, quando menos, críticas endereçadas ao sistema notarial diante do paradoxo – especialmente na ótica daquele a quem se destina o documento. E se sobrevier litígio a respeito do conteúdo do ato jurídico (matéria estranha ao ato de reconhecimento de firma), a não coincidência das datas há de potencializar as críticas.
Dentre as decisões nesse sentido, podemos citar a decisão do Desembargador Valmir de Oliveira Silva, Corregedor-Geral da Justiça do Rio de Janeiro, em 18 de novembro de 2014, Processo nº 2014-057108, que acolheu parecer referente ao não reconhecimento de firma em documento pós-datado. Conclusão. Enfim, face do exposto e considerando a existência de normas expressas em outros Códigos de Normas, sugere-se que a consulta seja respondida negativamente. É o parecer, S.M.J.
Sob a presidência do Juiz Auxiliar da Corregedoria Adriano Gomes de Melo Oliveira, os membros da Comissão deliberaram:
(...) com abstenções do presidente e da Oficiala Rosângela Ribeiro, voto divergente da Oficiala Rachel Barbosa. Acompanharam o relator Sandro Mascarenhas e a Oficiala Marly Conceição (em substituição ao Oficial Geraldo H. Moromizato), o Oficial Valdiram Cassimiro, com a ressalva de que a Corregedoria expeça recomendação no sentido de que, apesar de não haver a obrigatoriedade de análise de conteúdo, os tabeliães observem as condições do documento objeto de reconhecimento de firma, em atenção a segurança jurídica do ato.
Vieram-me os autos conclusos. Decido.
Em que pese o art. 15 e seus incisos [1] da Lei nº 2.828/2014 prescrever que o Corregedor-Geral da Justiça, nos casos de divergência na interpretação da Lei, proferirá decisão, definindo, no caso de divergência, o entendimento administrativo a ser uniformizado, o art. 20, nas Disposições Gerais e Finais da mesma Lei, diz que outros assuntos de natureza notarial e de registro poderão ser objeto de deliberação da Comissão, veja-se:
Art. 20 Incumbe ao Corregedor-Geral da Justiça instituir, no prazo de 30 dias da vigência desta Lei, a Comissão Permanente de Assuntos Notariais e Registrais.
§1º À Comissão de que trata este artigo compete propor ao Corregedor-Geral da Justiça as modificações e direcionamentos na interpretação e aplicação desta Lei, bem assim outros assuntos de natureza notarial e de registro. (...)
Sendo assim, demonstra-se a pertinência da matéria, objeto desses autos.
Em que pese os argumentos trazidos pelo relator endossados pelos membros da distinta Comissão, o parecer não comporta acolhimento e sobre o qual divirjo.
O reconhecimento de firma é o ato pelo qual o Tabelião atesta que a assinatura constante de um documento corresponde àquela da pessoa que a lançou, seja por autenticidade ou por semelhança.
Trata-se, de ato de reconhecimento cuja eficácia gira em torno da conferência da assinatura, produzindo efeitos tão somente em relação aos aspectos formais do ato jurídico praticado, não interferindo no teor do negócio jurídico em si.
O artigo 7º do Provimento nº 06/2006 da Corregedoria Geral da Justiça do estado do Tocantins apenas veda o reconhecimento de firma em documentos sem data, incompletos ou que contenham, no contexto, espaços em branco, silenciando a respeito de documentos pós-datados.
A questão já foi objeto de exame de outras Corregedorias Gerais da Justiça, como a de São Paulo, em recente decisão:
RECONHECIMENTO DE FIRMA – Documento pós-datado – As NSCGJ, em seu Tomo II, Capítulo XIV, item 189, vedam o reconhecimento de firma em documentos sem data, incompletos ou que contenham, no contexto, espaços em branco, silenciando a respeito dos documentos pós-datados – Função do reconhecimento de firma que é apenas a de verificar a assinatura, e não a validade e eficácia do negócio jurídico – Eventual nulidade do negócio que deve ser buscada na via jurisdicional – Recurso não provido. PROCESSO Nº 2015/41659. (191/2015-E). FERRAZ DE VASCONCELOS. D. E P. F. LTDA. EPP. Advogada: V. G. F. B. M., OAB/SP XXX.XXX.
Naquele parecer o Juiz Assessor da Corregedoria do Estado de São Paulo colaciona decisão oriunda da 2ª Vara de Registros Públicos da Comarca de São Paulo nos autos do processo n° 583.00.2007.222090-4, proferida pelo Exmo. Juiz Márcio Martins Bonilha Filho, de cuja r. decisão transcrevo trecho, verbis:
A ilação extraída pelo denunciante parte de premissa equivocada, em virtude da afirmação de que o contrato assinado pelas partes interessadas só teria existência a partir de 1º de setembro de 2007, vale dizer, da data futura lançada no documento, então apresentado para reconhecimento de firma em 27 de agosto precedente. Confundiu-se existência com vigência, na fixação da data da assinatura do contrato de locação. Existia o contrato, com indicação precisa do termo inicial e final do ajuste locatício, do prazo de locação, e a indicação que corresponderia à data futura da assinatura, nas circunstâncias, não impedia, à falta de expressa proibição legal ou disposição normativa, a efetivação do reconhecimento das firmas nela apostas, que não cria, nem extingue direitos. Não incumbe ao Tabelião ou ao Registrador examinar pormenores relativos à determinação do prazo de vigência, que cabe exclusivamente às partes contratantes, e não se confunde com o início da existência do contrato, como bem ponderou o Tabelião do 14° Tabelionato de Notas da Capital, na intervenção de fls. 28. Tampouco se admite a confusão entre data e existência do contrato. Nesse particular, a fé pública do Tabelião não será afetada: verifica-se a autenticidade e a veracidade das assinaturas, e não o aspecto de nulidade do negócio jurídico, que, eventualmente, poderá ser questionada na via jurisdicional adequada, à luz das disposições do artigo 167, parágrafo 1º, inciso III do Código Civil, que, aqui, não é dado esmiuçar. E irrecusável que, nessa matéria, não cabe ao Tabelião aferir se há ou não simulação. Aliás, nesse contexto, há que se recordar que, no que se refere à data de documento particular, a matéria é regida pela regra contida no art. 370, inciso V, do Código de Processo Civil, no sentido de que se considera datado o documento particular "do ato ou fato que estabeleça, de modo certo, a anterioridade da formação do documento". Enfim, desborda das funções notariais a análise das questões relativas à eficácia, vigência e validade dos documentos particulares submetidos a simples reconhecimento de firmas de seus signatários. Os efeitos dos contratos, em caso da controvérsia, devem ficar sujeitos à apreciação jurisdicional da instância competente, refugindo do âmbito das atribuições notariais e da competência da Corregedoria Permanente. Por conseguinte, não vislumbrando irregularidade na prática do ato questionado, acolhido o judicioso parecer de fls. 44/48, determino o arquivamento dos autos.
Ante o entendimento esposado, defiro o pedido exordial feito pela gerente do Banco do Brasil, devendo o 2º Tabelionato de Notas de Palmas/TO proceder com o reconhecimento de firma, ainda que em documento pós-datado, em razão de que a função do ato de reconhecimento de firma é apenas a de verificar a assinatura, e não a validade e eficácia do negócio jurídico.
Notifique-se a reclamante, dando ciência desta decisão.
Dê-se ciência a oficiala do 2º Tabelionato de Notas de Palmas/TO, Sagramor Angela Piccoli Dall Agnol, via Comunica, bem como ao Juiz Corregedor Permanente da Comarca de Palmas/TO.
Encaminhe-se cópia desta decisão ao setor de Informática para inserção no repositório de Decisões Normativas da Corregedoria Geral da Justiça no portal do e-legis.
Ao final, arquive-se com as baixas de estilo.
Cumpra-se.
[1] Art. 15. No caso de divergência na interpretação desta Lei, cabe ao corregedor-geral da justiça instaurar procedimento de uniformização com vistas a padronizar o entendimento administrativo sobre emolumentos.
§ 1º Instaurado o procedimento de uniformização, é aberto à Comissão Permanente de Assuntos Notariais e Registrais o prazo de 15 dias para manifestar-se.
§ 2º Decorrido o prazo para a manifestação a que se refere o § 1º deste artigo, cabe ao Corregedor-Geral da Justiça proferir decisão, em igual prazo, definindo, no caso de divergência, o entendimento administrativo a ser uniformizado.
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Documento assinado eletronicamente por Desembargador Eurípedes Lamounier, Corregedor-Geral da Justiça, em 29/11/2016, às 16:06, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. |