Decisão Nº 1329 / 2020 - CGJUS/ASJECGJUS
ACOLHO o Parecer Nº 336/2020 - CGJUS/ASJECGJUS, do Juiz Auxiliar desta Corregedoria, Dr. Márcio Barcelos Costa, por seus próprios fundamentos, o qual manifestou-se da seguinte forma:
1. Quanto a dúvida constante do Ofício nº 8674/2020/SR(26)TO-G/SR(26)TO/INCRA-INCRA, para as hipóteses de: desmembramento, parcelamento, remembramento e em qualquer situação de transferência de imóvel rural é necessário proceder à retificação administrativa de cada matricula individualizada, não se admitindo proceder nos casos de parcelamento ou remembramento sem que seja realizada a retificação do imóvel objeto da matrícula individualizado nos termos do art. 213, da Lei 6.015/73;
2. Quanto a dúvida constante do Ofício nº 10482/2020/SR(26)TO-G/SR(26)TO/INCRA-INCRA, o entendimento diante dos princípios registrais baseando-se, sobretudo, pelo princípio da segurança jurídica é de que para imóveis localizados em duas ou mais circunscrições imobiliárias, ao nosso entender, é perfeitamente possível o seu desmembramento para que seja efetivado o registro do memorial descritivo correspondente a cada circunscrição no cartório que detém a competência territorial.
Parecer Nº 336 / 2020 - CGJUS/ASJECGJUS
Excelentíssimo Senhor Corregedor-Geral da Justiça,
Trata-se de procedimento administrativo, instaurado em razão dos Ofícios Nº 8674/2020/SR(26)TO-G/SR(26)TO/INCRA-INCRA e 10482/2020/SR(26)TO-G/SR(26)TO/INCRA-INCRA, pelo qual o Superintendente do INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA/TO, formula consulta e solicita orientação sobre qual procedimento a ser adotado nas seguintes Retificações registrais;
Questionamento 1: em ações de REMEMBRAMENTOS, informa que as metodologias empregadas no georeferenciamento, dependem da forma em que a parcela for registrada (evento nº 3027228);
Apresenta duas formas empregadas hoje no Estado, dizendo que estes dois modelos divergem na forma de realizar o georeferenciamento na parcela:
I - Georreferenciar o perímetro externo das matrículas que se deseja remembrar, gerando um único memorial certificado, encerrar as matriculas de origem e abrir a nova matrícula com a área remembrada;
II - Georreferenciar individualmente cada matricula que se deseja remembrar, gerando um memorial certificado para cada matrícula, encerrar as v individualmente, abrir novas matrículas para cada parcela, requer o cancelamento via Sistema de Gestão Fundiária (SIGEF) de todas as parcelas certificadas, enviar novo polígono com o perímetro externo das matrículas que se deseja remembrar, gerando um único memorial certificado, encerrar as matrícula de origem e abrir a nova matrícula com a área remembrada;
Acena sobre um caso concreto em que um CRI expediu uma nota devolutiva determinando o cancelamento da parcela remembrada para que fossem certificadas individualmente as parcelas que se deseja remembrar e, só após, requerer de fato o remembramento;
Questionamento 2: em ações de parcelas que são cortadas por limites municipal/circunscrição, informa que as metodologias empregadas no georeferenciamento, dependem da forma em que a parcela for registrada (evento nº 3039447);
Apresenta duas formas empregadas hoje no Estado, dizendo que estes dois modelos divergem na forma de realizar o georeferenciamento na parcela:
I - Georreferenciar a parcela dividindo-a em partes para cada município/circunscrição, gerando um memorial certificado para cada parte, averbar na matrícula a área referente a cada município/circunscrição, encerrar a matrícula e abrir novas matrículas para cada município/circunscrição, utilizando o seu memorial certificado;
II - Georreferenciar o perímetro original, gerando um único memorial certificado, encerrar a matrícula no município/circunscrição de origem abrindo novas matrículas para cada município/circunscrição, utilizando o mesmo memorial certificado. Neste modelo não teremos um calculo de área oficial de 1 cada município/circunscrição.
A título de exemplo, apresenta um caso concreto em que o Cartório de Registro de Imóveis de Lizarda-TO, emitiu nota:
“Com fundamento no Art. 169, I da Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), providencie-se a unificação da certificação. urna vez que a área do imóvel encontra-se matriculada em sua totalidade nesta Serventia. Após a regularização, com ou sem manifestação do requerente, voltem os autos conclusos para a competente qualificação registral".
Ao final, pugna por orientação desta Egrégia Corregedoria-Geral de Justiça, no sentido de unificar os procedimentos em casos semelhantes;
Em Síntese é o relatório. Opino.
Com a edição da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, denominada Lei de Registros Públicos, dentre várias inovações, houve a instituição da matrícula, o repositório de todas as situações jurídicas relativas ao imóvel.
Dentre elas a localização precisa dos imóveis rurais é uma exigência antiga da sociedade brasileira, pois, traria maior transparência e tranquilidade aos proprietários, evitando possíveis sobreposições de áreas, fato que é recorrente em muitos municípios do território nacional, o que provoca a insegurança do sistema registral como um todo;
Com a edição da Lei Federal nº 10.267/01, que dentre outras alterações, modificou o teor dos artigos 176 e 225, § 3º, da Lei de Registros Públicos, tendo como objetivo a imposição do georeferenciamento das áreas rurais, com o intuito de evitar distorções e fraudes nos registros dos imóveis, possibilitando maior segurança nas transações imobiliárias.
Em razão dessa necessidade, sobreveio o Decreto Federal nº 4.449/2002, regulamentador estabelecendo critérios e prazos a partir dos quais o georeferenciamento dos imóveis rurais será obrigatório, art. 10, vejamos:
Art. 10. A identificação da área do imóvel rural, prevista nos §§ 3o e 4o do art. 176 da Lei no 6.015, de 1973, será exigida nos casos de desmembramento, parcelamento, remembramento e em qualquer situação de transferência de imóvel rural, na forma do art. 9o, somente após transcorridos os seguintes prazos: (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)
I - noventa dias, para os imóveis com área de cinco mil hectares, ou superior;
II - um ano, para os imóveis com área de mil a menos de cinco mil hectares;
III - cinco anos, para os imóveis com área de quinhentos a menos de mil hectares; (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)
IV - dez anos, para os imóveis com área de duzentos e cinquenta a menos de quinhentos hectares; (Redação dada pelo Decreto nº 7.620, de 2011)
V - treze anos, para os imóveis com área de cem a menos de duzentos e cinquenta hectares; (Incluído pelo Decreto nº 7.620, de 2011)
V - quinze anos, para os imóveis com área de cem a menos de duzentos e cinquenta hectares; (Redação dada pelo Decreto nº 9.311, de 2018)
VI - vinte anos, para os imóveis com área de vinte e cinco a menos de cem hectares; e (Redação dada pelo Decreto nº 9.311, de 2018)
VII - vinte anos, para os imóveis com área inferior a vinte e cinco hectares. (Incluído pelo Decreto nº 7.620, de 2011)
VII - vinte e dois anos, para os imóveis com área inferior a vinte e cinco hectares. (Redação dada pelo Decreto nº 9.311, de 2018)
§ 1o Quando se tratar da primeira apresentação do memorial descritivo, para adequação da descrição do imóvel rural às exigências dos §§ 3o e 4o do art. 176 e do § 3o do art. 225 da Lei no 6.015, de 1973, aplicar-se-ão as disposições contidas no § 4o do art. 9o deste Decreto. (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)
Transcorridos tais prazos, de acordo com a dimensão da área do imóvel rural, o Oficial do Registro de Imóveis fica proibido de praticar na matrícula imobiliária os seguintes atos: a) desmembramento; b) parcelamento; c) remembramento; d) transferência de área total; e e) criação ou alteração da descrição do imóvel, resultante de qualquer procedimento judicial ou administrativo nos termos do § º, do art. 10 do referido decreto.
(...)
§ 2o Após os prazos assinalados nos incisos I a IV do caput, fica defeso ao oficial do registro de imóveis a prática dos seguintes atos registrais envolvendo as áreas rurais de que tratam aqueles incisos, até que seja feita a identificação do imóvel na forma prevista neste Decreto: (Redação dada pelo Decreto nº 5.570, de 2005)
I - desmembramento, parcelamento ou remembramento; (Incluído pelo Decreto nº 5.570, de 2005)
II - transferência de área total; (Incluído pelo Decreto nº 5.570, de 2005)
III - criação ou alteração da descrição do imóvel, resultante de qualquer procedimento judicial ou administrativo. (Incluído pelo Decreto nº 5.570, de 2005)
Depreende-se da norma, que havendo solicitação de ato registral, posterior aos prazos estabelecidos nos incisos I a IV, ou seja, que implique desmembramento, remembramento, parcelamento ou alienação total do imóvel constante de sua respectiva matrícula, é obrigatório promover o levantamento topográfico georreferenciado da área constante na matrícula, elaborando memorial descritivo contendo as coordenadas dos vértices definidores de seus limites de acordo com o previsto na Lei, submetendo-o ao Incra a fim de que seja expedida a certificação de que a poligonal objeto do memorial descritivo não se sobrepõe a nenhuma outra constante de seu cadastro.
Portanto, as normativas legais acima descritas, busca definir a exata localização do imóvel, conforme as coordenadas de seus vértices, consoante previsto na Lei de Registros Públicos, com o georreferenciamento, o imóvel será plenamente identificado, a partir de indicações exatas de suas medidas, características e confrontações.
Nessa linha, esta Egrégia Corregedoria-Geral da Justiça, editou os Provimentos nº 06/2005, 01/2016 e no ano de 2017 o Provimento nº 06, que revogou os dois primeiros acerca do procedimento de retificação administrativa de matrícula para inserção das coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro.
Para maior clareamento, vejamos o que dispõe o art. 1º do Provimento nº 06/2017/CGJTO em vigor:
Art. 1º. A retificação administrativa de matrícula de imóvel rural, inclusive para os fins e efeitos do § 3º do art. 176 da Lei Federal nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, processa-se de acordo com o disposto no art. 213, II, da mesma Lei, perante o registrador de imóveis da circunscrição em que situado o imóvel retificando.
Necessário entender que a identificação do imóvel rural referida nos § 3º e 4º do art. 176 da Lei nº 6.015/93 é requisito da matrícula. Exigência imposta pela lei de registros públicos.
O Superior Tribunal de Justiça - STJ, firmou entendimento que o georreferenciamento se dá na matricula individualizada, vejamos:
MEMORIAL DESCRITIVO GEORREFERENCIADO. NECESSIDADE. LEIS 6.015 /1973 E 10.267 /2001. 1 - O princípio da especialidade impõe que o imóvel, para efeito de registro público, seja plenamente identificado, a partir de indicações exatas de suas medidas, características e confrontações. 2- Cabe às partes, tratando-se de ação que versa sobre imóvel rural, informar com precisão os dados individualizadores do bem, mediante apresentação de memorial descritivo que contenha as coordenadas dos vértices definidores de seus limites, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro. Inteligência do art. 225 , § 3º , da Lei n. 6.015 /1973. 3- Recurso especial provido. Jurisprudência•Data de publicação: 27/05/2013. STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 1123850 RS 2009/0126557-5 (STJ)
Como se observa, o princípio da especialidade passou a ter maior relevância, uma vez que a matrícula está subordinada à existência de uma descrição do imóvel correlata com a fática.
À vista disso, é de crucial relevo recordar a lição dos festejados Miguel Maria de Serpa Lopes e Afrânio de Carvalho acerca da especialidade objetiva:
“Contudo situações podem surgir, no caso de característicos e confrontações: ou o é impreciso, e nesse caso convém ser recusado, para que o titular de domínio melhor o componha por meios regulares, ou o título a transcrever contém característicos e confrontações em colisão com a transcrição anterior, hipótese em que se torna imprescindível, preliminarmente, a retificação da transcrição anterior, e a apuração da qual seja a verdadeiramente exata: Se a enunciação da transcrição existente ou a do título. (in tratado dos Registros Públicos, vol. IV, p. 430).
"Assim, o requisito registral da especialização do imóvel, vertido no fraseado clássico do direito, significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autônoma, com o seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto, heterogêneo em relação a qualquer outro. O corpo certo imobiliário ocupa um lugar determinado no espaço, que é o abrangido por seu contorno, dentro do qual se pode encontrar maior ou menor área, contanto que não sejam ultrapassadas as raias definidoras da entidade territorial.” (in Registro de Imóveis, pág. 247).
Apesar de correto os conceitos, poucos conseguem compreender sua abrangência havendo quem o restrinja demais, a ponto de deturpá-lo por completo.
Essa discrepância tem ocorrido por dois motivos:
1) pelo desconhecimento das técnicas de agrimensura, que são bastante antigas e sempre permitiram descrever com precisão os imóveis; e
2) pela forma usual como se descreviam os imóveis no passado.
Afrânio de Carvalho disse que a descrição deve representar “um corpo certo” com “individualidade autônoma”, tornando-o “inconfundível” e “heterogêneo em relação a qualquer outro”.
Além disso, com as novas regras do georreferenciamento (§§ 3º e 4º do artigo 176 e §3º do artigo 225, ambos da LRP) e com o remodelado sistema de retificação de registro (artigo 213 da LRP), não há mais como admitir a não-exigência de trabalhos técnicos bem elaborados, escorreitos, que atendam não apenas às necessidades de segurança jurídica do sistema registral da propriedade imobiliária, como também cumpra as regras específicas da agrimensura.
Ademais, a atuação da autarquia na certificação do georreferenciamento não se resume a chancelar os projetos que lhe são apresentados, em apreciação meramente formal, vai mais além, sendo possível extrair que entre os fins das alterações está o de interligar o sistema de cadastro do INCRA com o sistema registral, com dados fidedignos dos imóveis.
Observa-se que, de acordo com o art. 2º, parágrafo único, I, da Lei Federal nº 9.784/99, nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de "atuação conforme a lei e o Direito"
Desta maneira, se não há elementos suficientes à individualização do imóvel, o INCRA pode, por decisão fundamentada, indeferir a certificação. Este poder (dever, na verdade) decorre da própria finalidade da norma, que é a de conferir segurança e confiança ao sistema fundiário.
No tocante ao objeto próprio desse processo que, no sentido de uniformizar o entendimento, é bom lembrar que o procedimento do Oficial de Registro de Imóveis é de aferir, dentre outras coisas, se a área constante do memorial descritivo corresponde ao imóvel descrito na matrícula e se não está havendo violação a direitos de terceiros confrontantes, efetuando uma retificação da propriedade imobiliária, na forma estabelecida no art. 213 da Lei Federal nº 6.015/73.
Conclui-se, portanto, que cada matrícula representa uma unidade imobiliária e que para ser objeto de fusão e ou remembramento tem que estar com a sua descrição georreferenciada e certificada individualmente em atenção a norma legal, aliada ao princípio da especialidade, estado esse que será possível a unificação das áreas.
Quanto ao objeto do Ofício nº 10482/2020/SR(26)TO-G/SR(26)TO/INCRA-INCRA, passamos à sua análise:
Inicialmente convém mencionar, que a maneira como o território brasileiro foi ocupado e a forma como se deu o ingresso dos títulos de domínio nos primórdios do registro imobiliário são circunstâncias suficientes para concluir que a grande parte dos imóveis localizados nessa zona limítrofe tiveram sua localização municipal definida por simples declaração do proprietário, sem a existência ou mesmo preocupação por qualquer sistema de controle.
Os imóveis, anteriormente de áreas imensas, foram sendo paulatinamente desmembrados e alienados, formando outros de menor tamanho que, por sua vez, eram também parcelados e alienados. Nesses parcelamentos, dificilmente efetivados mediante técnicas de agrimensura, competia ao proprietário definir a nova descrição, a área e a localização de seu pedaço de terra. A consequência disso é o conturbado cenário atual tanto do cadastro imobiliário (a cargo do Incra) como do registro imobiliário.
Feitas essas breves considerações, passamos para o estudo das áreas que se situam em mais de um município, ou seja, circunscrições limítrofes. Aos oficiais do registro de imóveis compete praticar atos relacionados na legislação pertinente aos registros públicos de que são incumbidos, mas sujeitos as limitações de suas circunscrições geográficas;
Depreende-se que a Lei Federal nº 10.267/01, deu nova redação ao inciso II, do artigo 169 da Lei de Registros Públicos, vejamos:
Lei Federal nº 6.015/73
Art. 169 “Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no Cartório da situação do imóvel, salvo:
(...)
II – os registros relativos a imóveis situados em comarcas ou circunscrições limítrofes, que serão feitos em todas elas, devendo os Registros de Imóveis fazer constar dos registros tal ocorrência. (Redação dada pela Lei nº 10.267, de 2001)
Nessa mesma linha, esta Corregedoria-Geral de Justiça editou o Manual de Normas de Serviço Notarial e Registral do Estado do Tocantins, Provimento nº 02/2013/CGJUSTO, em vigor, onde podemos notar claramente em seu art. 113, a orientação sobre o procedimento a ser adotado.
(...)
Art. 113. Todos os atos enumerados no artigo acima são obrigatórios e serão efetuados no Registro de Imóveis da situação do imóvel, salvo as averbações, que serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição; e os registros relativos a imóveis situados em comarcas ou circunscrições limítrofes, que serão feitos em todas elas, devendo constar dos atos tal ocorrência.
A própria lei estabeleceu que, os registros relativos a imóveis situados em comarcas ou circunscrições limítrofes, que serão feitos em todas elas.
Nesse caso, haverá tantos imóveis quanto o número de circunscrições fronteiriças, ou seja, ainda que para o proprietário seu imóvel exista fisicamente de forma individualizada, no âmbito registrário haverá em cada registro imobiliário limítrofe a respectiva matricula do imóvel.
Para Afrânio Carvalho: “apesar de múltiplo, cada um desses registros em diferente cartórios deve descrever o imóvel em sua totalidade, com as confrontações completas, embora declare parte situada em área sob a jurisdição de outro cartório”.
Na lição de Cunha Gonçalves: “Não há nenhum preceito legal que autorize o registrador, ou a parte, a fracionar o imóvel para dele fazer duas descrições parciais, o que poderá fazer supor que se trate de dois imóveis, ou que ele já esta dividido”.
Nesse sentido, os registradores das circunscrições limítrofes deverão abrir matrícula para todo o imóvel, iniciando-se pela serventia de localização primitiva do imóvel (com informações dos municípios e suas respectivas áreas no cabeçalho da descrição tabular), em seguida o proprietário deverá fazer o mesmo procedimento em todas as demais serventias que respondem pela circunscrição, devendo em todas constarem informações recíprocas das matrículas existentes nas demais serventia em razão do procedimento, ademais qualquer ato posteriormente a ser praticado no respectivo imóvel deverá ser realizada em todas as matrículas que constituem o respectivo imóvel.
Ao nosso ver, trata-se de um procedimento dispendioso ao proprietário, além de ser objeto e método que causa grande insegurança jurídica, dada a necessidade do registro ou averbação ser praticado em todas as matrículas, uma vez que ambas matrículas precisam estar com reproduções idênticas.
Respectiva norma, tem cunho retrógrado, sendo sua prática inviável de ser processada.
Todavia, o procedimento mais coerente, é o desmembramento do imóvel, de forma que cada parcela resultante (imóvel autônomo, matriculado) fique integralmente no território de um município, sendo registrada no cartório competente, em atenção ao princípio da territorialidade. Que por sua vez, evitaria uma série de problemas, principalmente os relativos às competências administrativa, tributária, jurisdicional e registral.
Nesse trilhar de entendimento, no §4º do art. 9º do Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002, que regulamenta a Lei Federal nº 10.267, de 28 de agosto de 2001, assim dispõe:
Art. 9º (...)
§ 5º. O memorial descritivo, que de qualquer modo possa alterar o registro, resultará numa nova matrícula com encerramento da matrícula anterior no serviço de registro de imóveis competente, mediante requerimento do interessado, contendo declaração firmada sob pena de responsabilidade civil e criminal, com firma reconhecida, de que foram respeitados os direitos dos confrontantes, acompanhado da certificação prevista no § 1o deste artigo, do CCIR e da prova de quitação do ITR dos últimos cinco exercícios, quando for o caso.
Verifica-se que, não obstante vigente a disposição do art. 169, II, da Lei Federal nº 6.015/73, nos casos de retificação administrativa de matrícula decorrentes de georreferenciamento de imóveis rurais, prevalece o disposto na norma específica, que determina a apresentação de um memorial descritivo para o registrador de imóveis competente, resultando na abertura de uma nova matrícula para o exclusivo perímetro que ele tem competência.
Seguindo a mesma linha, o legislador já promoveu recente alteração na redação do art. 171, da Lei nº 6.015/73, assim o dispositivo em comento não trata mais de exceção ao princípio da territorialidade, estabelecendo que o registro das linhas férreas devem ser feitas cada parte na serventia de registro de imóveis em que o trecho do tapete de trilhos estão localizados, ou seja, respectivamente no folio real da circunscrição territorial.
Ademais, a função registral desenvolvida pelo registrador na prática dos atos registrais é orientada pelo ordenamento jurídico positivo e, também, por um conjunto de princípios de caráter normativo que informam e conformam a atividade registral, fornecendo as condições fundamentais para a operacionalização de todo o Sistema Registral.
Os princípios são, portanto, instrumentos para a racionalização e unificação do Sistema jurídico-normativo Registral em sua totalidade. Possuindo uma função integradora e especificadora dentro do ordenamento jurídico: orienta e direciona a atuação e aplicação das normas constitucionais e legais.
O princípio da territorialidade tem fundamental importância na delimitação de competência do registrador e assume função de importante instrumento na obtenção e preservação da publicidade registral, uma vez que busca racionalizar e dar máxima efetividade ao princípio da publicidade. Há, portanto, uma relação indissociável entre estes dois importantes institutos jurídicos, que, possui função complementar, tendo por escopo garantir segurança jurídica aos atos registrais.
Em sua essência o respectivo princípio, visa facilitar o acesso à informação, seja referente a imóveis ou pessoas, garante publicidade aos atos e registros de sua competência, o que, sem dúvida, gera uma maior segurança jurídica aos negócios jurídicos, pois será possível antever quais os possíveis efeitos dos atos e negócios jurídicos celebrados.
Surge então o problema. Como definir essa linha divisória nos levantamentos georreferenciados dos imóveis rurais que se encontram na zona limítrofe dos municípios? Como precisar esses dados? A quem compete tal definição? Quais são as responsabilidades decorrentes?
A definição se um imóvel rural se encontra localizado em um ou outro município pode parecer de pouca importância, uma vez que, à primeira vista, a única consequência prática seria o desvio do repasse de parcela do ITR arrecadado pela União (de valor muito baixo) para o outro ente político.
Entretanto, com muita propriedade salientou o Dr. Roberto Tadeu Teixeira, chefe do setor de cadastro do Incra-SP, em suas palestras sobre o georreferenciamento: a história muda se nesse imóvel é encontrada uma grande jazida de petróleo ou ali venha a funcionar uma grande fábrica com enorme potencial de receita tributária em favor do município competente”.
As alterações efetivas na Lei dos Registros Públicos pela Lei nº 10.267/01 gerou a obrigação de georreferenciar todos os imóveis rurais do País, o que está sendo efetivado paulatinamente, em obediência aos prazos carenciais previstos no Decreto nº 4.449/02.
A precisão da descrição georreferenciada não se compatibiliza de forma alguma com as descrições antigas que se utilizavam tão somente da indicação de acidentes naturais ou obstáculos artificiais de fácil visualização, como pontes, estradas e marcos de concreto.
Dessa forma, o levantamento de um imóvel rural localizado na zona limítrofe entre municípios porá fim, à uma série de dúvidas, quanto a sua localização física no planeta (o que, de certa forma, está garantida pelo sistema GPS), bem como, quanto à sua localização jurídico administrativa, ou seja, dando certeza a qual município pertence aquele pedaço de terra, principalmente se a divisa intermunicipal daquela zona limítrofe for precária e de difícil definição.
O registro das respectivas parcelas no cartório de registro de imóveis responsável pela respectiva circunscrição territorial municipal, por via de consequência dessa definição desses limites, impedirá sérios prejuízos a um ente público e, em contrapartida, conferindo vantagens significativas ao município, com a definição de competências e procedimentos que sejam, ao mesmo tempo, seguros, possíveis e jurídicos.
A retificação da descrição tabular do imóvel, quer pelo sistema do georreferenciamento ou mesmo por outra descrição técnica aceita pela agrimensura, tem por objetivo aprimorar a especialidade objetiva do imóvel, tendo cada circunscrição sua matricula própria, conferindo maior confiabilidade ao registro público e gerando a necessária segurança jurídica aos direitos reais ali assentados.
Com isso, a determinação das duas parcelas é de grande importância, para definir competências e prevenir litígios. Bastando o descobrimento de uma grande riqueza mineral nesse imóvel para comprovar essa necessidade.
Corrobora, com este posicionamento até mesmo a plataforma disponibilizada pelo INCRA para o processamento do georreferenciamento SIGEF, o qual não admite posicionar o imóvel em duas circunscrição, com números de matrículas distintas.
Em consonância a segurança jurídica, que é um dos pilares que devem sustentar a solução para esse impasse, que será conferida com o desmembramento de imóvel localizado na zona limítrofe.
Na hipótese da gleba estar localizada em duas ou mais circunscrições imobiliárias, ao nosso entender é perfeitamente possível o seu desmembramento, para que seja efetivado o registro do memorial descritivo correspondente a cada circunscrição no cartório que detém a competência territorial.
Portanto, imóvel interceptado ou confrontante com divisa, intermunicipal, deve-se levantar a divisa de forma precisa (conforme os termos da Lei estadual) e dividir/desmembrar o imóvel em matrículas autônomas.
Em face do exposto, o parecer que respeitosamente submeto à apreciação de Vossa Excelência é no sentido de que:
Quanto a dúvida constante do Ofício nº 8674/2020/SR(26)TO-G/SR(26)TO/INCRA-INCRA, para as hipóteses de: desmembramento, parcelamento, remembramento e em qualquer situação de transferência de imóvel rural é necessário proceder à retificação administrativa de cada matricula individualizada, não se admitindo proceder nos casos de parcelamento ou remembramento sem que seja realizada a retificação do imóvel objeto da matrícula individualizado nos termos do art. 213, da Lei 6.015/73;
Quanto a dúvida constante do Ofício nº 10482/2020/SR(26)TO-G/SR(26)TO/INCRA-INCRA, o entendimento diante dos princípios registrais baseando-se, sobretudo, pelo princípio da segurança jurídica é de que para imóveis localizados em duas ou mais circunscrições imobiliárias, ao nosso entender, é perfeitamente possível o seu desmembramento para que seja efetivado o registro do memorial descritivo correspondente a cada circunscrição no cartório que detém a competência territorial.
Sub censura.
Cumpra-se.
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Documento assinado eletronicamente por Desembargador João Rigo Guimarães, Corregedor-Geral da Justiça, em 07/04/2020, às 18:51, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. |
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Documento assinado eletronicamente por Márcio Barcelos Costa, Juiz Auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça, em 07/04/2020, às 13:25, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. |