Decisão Nº 2741 / 2020 - CGJUS/ASJECGJUS
ACOLHO o Parecer Nº 716/2020 - CGJUS/ASJECGJUS (evento nº 3252445), do Juiz Auxiliar desta Corregedoria, Dr. Márcio Barcelos Costa, por seus próprios fundamentos, o qual manifestou-se pelo provimento do recurso interposto para que o Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos e Protesto faça o apontamento dos referido título/contratos e na falta de pagamento o Protesto.
Razão pela qual, determino o seguinte:
1. notificação do requerente para conhecimento;
2. notificação da Sra. Maria do Socorro Falcão Caldeira - Delegatária Interina do Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos e Protestos do Município de Araguaína-TO para conhecimento e cumprimento desta decisão, sob pena de sanções disciplinares cabíveis nos termos da Lei nº 8.935/94, podendo culmina na revogação da interinidade nos termos do inciso XVII, do art. 25 da Lei Complementar nº 112/18;
3. remessa dos autos à Seção de Informática desta Corregedoria para disponibilização do parecer e desta decisão no sistema e-legis, para alimentar o banco de jurisprudência desta Corregedoria;
4. Dê ciência à MM. Corregedora Permanente da Comarca.
À Divisão de Normas, Procedimentos Judiciais e Administrativos para providências de mister.
Cumpra-se.
Parecer Nº 716 / 2020 - CGJUS/ASJECGJUS
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,
Trata-se de recurso administrativo interposto pela empresa Kamito Agropecuária Ltda. - CNPJ 20.252.662/0001-66 em face da Decisão Nº 2155/2020 - PRESIDÊNCIA/DF ARAGUAÍNA (evento nº 3186821) que julgou improcedente o pedido de efetivação do apontamento de títulos com consequente protesto no caso do não pagamento dentro do prazo legal, bem como o cancelamento dos títulos já protestados, sem qualquer amparo legal.
Para melhor compreensão do caso, transcrevo o relatório da supracitada decisão:
"Trata-se de RECLAMAÇÃO, promovida, via advogado, pela empresa Kamito Agropecuária Ltda. - CNPJ 20.252.662/0001-66, em desfavor da Oficial interina do Serviço de Tabelionato de Protestos de Títulos, Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos e Documentos de Araguaína, Sra. Maria do Socorro Falcão Caldeira, alegando que a referida Oficial se opôs a protestar documentos de dívida e também cancelou protestos anteriormente realizados, sem qualquer amparo legal.
A Reclamante afirma, em síntese, que entabulou negócios com a empresa Vignis e matriz da Votorantim assumiu como interveniente anuente nesses negócios; essas duas empresas não cumpriram com as obrigações; não restando-lhe alternativa senão o protesto dos "pagamentos mensais inadimplidos"; entretanto alega que a Oficial interina opôs "firme resistência" em protestar a empresa Votorantim, alegando que "eles 'FALARAM' para ela [Oficial] não o fazer, pois eles [Votorantim] estariam com a verdade ao seu lado e, a nobre cartorária, resolveu atendê-los de ofício"; também "cancelou DE OFÍCIO os protestos anteriormente realizados"; a Oficial "correu para se socorrer no juízo de primeiro grau pleiteando uma decisão judicial que a escore". Aduz que a cláusula 4.2 do aditivo do contrato dispõe que a Votorantim sub-roga-se "automaticamente nos direitos e deveres contratuais" e não cabe à Oficial "entrar no mérito de uma relação comercial", restando somente cumprir os pedidos de protestos. Requer, ao final, que se determine à Oficial efetuar os protestos e refazer os que indevidamente cancelou. Juntou documentos.
Despacho Nº 11488 / 2020 - CGJUS/ASJECGJUS determinou a remessa ao Corregedor Permanente da Comarca de Araguaína, para adoção de providências, consignando o prazo de 30 dias para apresentação de informações à Corregedoria Geral da Justiça sobre o deslinde do feito.
Despacho Nº 31007 / 2020 - PRESIDÊNCIA/DF ARAGUAÍNA determinou a intimação da Oficial Interina para, no prazo de 05 (cinco) dias, manifestar-se sobre os fatos relatados na reclamação e todos os documentos acostados pela Reclamante; também disponibilizou acesso externo à Oficial.
Em resposta, a Oficial interina afirmou que recebeu por meio de credor a "INDICAÇÃO do contrato nº 004/2017, bem como sua cópia e o termo de aditivo, onde foram apontados e posteriormente protestados por falta de pagamento"; indicou os protocolos levados a protestos; constatou "que o segundo devedor relacionado na indicação (Banco Votorantim), na realidade não era coobrigado na dívida, pois trata-se de um INTERVENIENTE ANUENTE"; considerando que o Banco Votorantim foi relacionado na indicação como devedor e "avaliando a não obrigação deste no contrato original, este Tabelionato decidiu por manter os protestos em nome do devedor principal e cancelar de ofício os protestos realizado em nome do Banco, nos termos do Art. 25 da Lei 9.492/97". Grifa, com relação à Cláusula 4.2 do aditivo mencionado, que: "... bastando para tanto que a INTERVENIENTE ANUENTE notifique os PARCEIROS OUTORGANTES e o PARCEIRO OUTORGADO por escrito" e ressalta que o interveniente anuente notificou os parceiros em 30/05/2018, "informando que não exerceria o direito de assumir a posição contratual da Vignis (devedor principal) no contrato". Entende que o apresentante deve comprovar ao Tabelionato "que houve a rescisão antecipada do contrato e ainda a notificação pelo INTERVENIENTE ANUENTE aos mesmos". Disse que orientou o "credor que relacionasse como devedor somente em sua indicação somente o devedor principal (Vignis), caso contrário apresentasse documentos que indicassem ser o Banco Votorantim coobrigado na dívida". Suscitou dúvida, na data de 22/11/2019, ao Juízo, via e-Proc (0028127-87.2019.827.2706), na qual indagou "se o Cartório deve manter o cancelamento ou restabelecer o protesto referente ao interveniente anuente uma vez que em relação ao devedor principal o protesto foi mantido". Ao final, requereu pela improcedência da reclamação. Juntou documentos."
A recorrente, irresignada interpôs este recurso para que seja conhecido e, no mérito, provido para determinar à Oficala do Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos e Protesto de Araguaína que proceda à efetivação do Prostesto da empresa Votorantim Cimentos.
Vieram os autos conclusos para deliberações.
É o relatório.
Opino.
É admissível o recurso administrativo contra todas as decisões proferidas pelos Juízes Corregedores Permanentes, em matéria administrativa ou disciplinar, ainda que não definitivas. O conhecimento do recurso está autorizado com base no poder de autotutela administrativa conferido à E. Corregedoria-Geral de Justiça.
O presente recurso é tempestivo consoante ao prazo previsto no art. 95 da Lei Complementar nº 10/1996.
Art. 95. O prazo para interpor recurso de qualquer decisão administrativa é de 15 (quinze) dias.
Ainda prevê a competência do Corregedor-Geral para conhecer dos recursos nos termos do art. 98 em processar e julgar referidos processos, vejamos:
Art. 97. São competentes para conhecer do recurso:
I - o Corregedor-Geral da Justiça, das decisões dos juizados do 1º grau de jurisdição e do Juiz de Direito Presidente dos Conselhos da Justiça Militar, quando se cogitar de matéria de natureza disciplinar;
Pontuada a competência desta D. Corregedoria para analise da peça recursal, passamos ao objeto do processo.
De fato, entende-se que os contratos bilaterais podem ser objeto de protesto, desde que atendem aos requisitos da exigibilidade, certeza e liquidez da dívida.
Segundo a norma contida no art. 1º da Lei 9.492/97, "Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos (Cheque, Duplicata Mercantil, Nota Promissória, documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas, etc) e outros documentos de dívida" e serve também para fixação do termo de inicial de encargo, quando o título não lhe trouxer expresso.
Destina-se, basicamente, a cumprir duas funções: a de provar publicamente o atraso do devedor e a de resguardar o direito de crédito. O protesto de outros documentos de dívida depende da interpretação do tabelião. Assim, a análise formal e se é o título protestável ou não, é feita após a apresentação do documento a protesto, o que não é o caso.
O tabelião de protesto de títulos, profissional do direito dotado de fé pública, exercerá a atividade notarial que lhe foi delegada, observando os deveres próprios da função pública na qual foi investido, de modo a garantir a autenticidade, publicidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.
Sua atuação pressupõe provocação da pessoa interessada, com base no princípio da rogação ou da instância, não podendo negar-se a realizar atos próprios da função pública que lhe foi confiada, salvo qualificação notarial negativa, com a recusa sendo expressa por escrito e motivadamente.
Na qualificação dos títulos apresentados no serviço de protesto de títulos e outros documentos de dívida, que deve subsistir durante todo o percurso do título no Tabelionato e de sua passagem pelo serviço de distribuição, se houver, não cabe qualquer discussão sobre a causa dos títulos ou documentos de dívida. Situação essa que deve ser estabelecida no judiciário. Assim não compete ao tabelião investigar a ocorrência de prescrição ou decadência do título.
Fato incontroverso é, que no serviço de protesto a análise resumir-se-á aos caracteres formais que devem estar presentes como estabelece o parágrafo único do art. 9º da Lei nº 9.492/97.
Art. 9º Todos os títulos e documentos de dívida protocolizados serão examinados em seus caracteres formais e terão curso se não apresentarem vícios, não cabendo ao Tabelião de Protesto investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade.
Parágrafo único. Qualquer irregularidade formal observada pelo Tabelião obstará o registro do protesto.
Nesse sentido leciona Walter Ceneviva ao dizer que a existência de irregularidade formal não impede o protesto de título que constitua dívida (Lei dos Notários e registradores comentada. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 74).
A lei em comento, não prevê expressamente a devolução do título, muito pelo contrário nos termos do art. 5º da lei nº 9.492/97, estabelece que todos os títulos serão protocolizados.
Art. 5º Todos os documentos apresentados ou distribuídos no horário regulamentar serão protocolizados dentro de vinte e quatro horas, obedecendo à ordem cronológica de entrega.
Assim, no que se refere aos vícios formais do título, alguns exemplos podem ser citados, como falta do lugar do pagamento ou a discrepância entre a base territorial de competência do Tabelionato e a constante no instrumento apresentado.
O pedido formulado pela recorrente e indeferido pela autoridade local, porém, deve ser apreciado, consideradas as balizas estabelecidas para a atuação administrativa dos órgãos censores.
Com efeito, o art. 17 da Lei Nº 9.492/97, ao dispor acerca da sustação do protesto, como medida cautelar apta a obstar o curso do procedimento a ser respeitado, obrigatoriamente, pelos tabeliães e fixado, de maneira especial, para a realização de tal ato jurídico em sentido estrito, o qualificou como judicial. tal adjetivo há de ser entendido num sentido estrito, porquanto as arguições presentes em tal espécie de processo, no mais das vezes, escapam à esfera de atuação dos órgãos censórios do poder judiciário.
Há casos, no entanto, em que a exterioridade e evidência de um vício apurado a partir do exame atento de elementos constantes do título recepcionado e levado a protesto permite, aos órgãos censórios do poder judiciário, sua verificação e, por consequência, o advento de providências administrativas saneatórias, que passam pela suspensão administrativa do procedimento do protesto e visam à requalificação do título recepcionado.
O juiz, no uso de sua superioridade hierárquica, efetiva uma segunda análise do título e, ao verificar uma falha na qualificação, pode impedir a efetivação do protesto ou, então, caso ele tenha sido lavrado, cancelá-lo.
Os órgãos censórios do poder judiciário, todavia, nem mesmo excepcionalmente, podem conhecer, nos estritos limites de suas atribuições administrativas, de fatos pertinentes à causa embutida no título recepcionado sem qualquer expressão literal no documento e dependentes da produção de provas, o que só poderá ser operado sob o crivo do contraditório e é próprio à atividade jurisdicional judicial.
Fixadas tais limitações e analisados os documentos que acompanharam o recurso sobreveio manifestação prestadas pelo Ministério Público Estadual nos Autos nº. 0028127-87.2019.8.27.2706, auzindo que não vislumbra a presença de vício formal, aferido pelo exame dos documentos apresentados pelo requerente do protesto, ora recorrente.
Ademais os requisitos apontado na decisão recorrida em que a Tabeliã utilizou-se para, fundamenta a inadmissibilidade do título art. 22 da Lei nº 9.492/97, não diz respeito ao título, mais requisitos que devem conter no instrumento de protesto, ou seja, no ato do Tabelião.
Art. 22. O registro do protesto e seu instrumento deverão conter:
I - data e número de protocolização;
II - nome do apresentante e endereço;
III - reprodução ou transcrição do documento ou das indicações feitas pelo apresentante e declarações nele inseridas;
IV - certidão das intimações feitas e das respostas eventualmente oferecidas;
V - indicação dos intervenientes voluntários e das firmas por eles honradas;
VI - a aquiescência do portador ao aceite por honra;
VII - nome, número do documento de identificação do devedor e endereço;
VIII - data e assinatura do Tabelião de Protesto, de seus substitutos ou de Escrevente autorizado.
Parágrafo único. Quando o Tabelião de Protesto conservar em seus arquivos gravação eletrônica da imagem, cópia reprográfica ou micrográfica do título ou documento de dívida, dispensa-se, no registro e no instrumento, a sua transcrição literal, bem como das demais declarações nele inseridas.
O dispositivo em comento estabelece os requisitos que o termo do protesto e seu instrumento devem conter, redação essa semelhante a do art. 29 do Decreto nº 2.044/1908, que foi o ordenamento mãe do protesto no Brasil.
Deste modo o inciso III, deve ser lido em conjunto com o parágrafo único do artigo, tendo em vista que por ser serventia totalmente informatizada dispensa a reprodução do título no instrumento de protesto, razão pela qual, o termo de protesto pode conter apenas a menção aos elementos do documento.
Ademais, não há previsão legal que autorize ao tabelião obstar o protesto de um título, com a exigência que o credor ou apresentante comprove ter havido rescisão contratual, haja visto nos termos do parágrafo único do art. 5º da Lei nº 9.492/97, responder pelos dados fornecidos ao tabelião.
Parágrafo único. Ao apresentante será entregue recibo com as características essenciais do título ou documento de dívida, sendo de sua responsabilidade os dados fornecidos.
Não há dúvidas alguma que o documento de dívida apresentado contém todas as características para efetivação do apontamento.
Para fica mais claro quem realmente tem a Responsabilidade Civil pelo apontamento do Protesto em cartório, gerando o Protesto indevido, conforme o posicionamento de Darold, o qual leciona o seguinte:
No caso do boleto, o emitente ou pretenso credor sempre responderá civilmente caso venha o boleto a ser apontado a Protesto, a menos que comprove ter orientado o mandatário a não procedê-lo, pois o simples fato de colocar em desconto ou circulação do documento não legitimado a tanto, e menos ainda ao Protesto, traduz-lhe a culpa (DAROLD, Ermínio Amarildo. Protesto cambial: duplicatas X boletos. p. 94.)
Dessa forma, nota-se a importância que é o conhecimento de cada documento existente, pois como citado a título de exemplo, o boleto no caso, não é título protestável, sendo que o simples fato do mesmo ser descontado, não quer dizer que o mandatário tem este poder. Se a negligência parte do credor, que envia o título a Protesto, ele será responsabilizado civilmente, mas se este ato provir de mandatário que não foi autorizado para tanto, este será responsabilizado.
Não há que se falar em responsabilidade do tabelião, pois superada a análise formal do documento que lhe é competência não cabe impedir seu apontamento.
Inexistente a irregularidade formal como é notadamente o caso do contrato particular de pareceria agrícola levada a protesto, nenhum vício de forma se vislumbra. Neste sentindo nada justifica a recusa da Tabeliã em protocolar promover os procedimentos legais para notificação do devedor para adimplemento da dívida ou na sua falta promover o protesto do título ora pretendido em esfera de revisão hierárquico-correcional.
De fato, ainda não há falta funcional por parte da delegatária, porém incorrendo na negativa da efetivação do protocolo do título, com posterior protesto em caso do não pagamento pelo devedor, caracterizará respectiva infração disciplina o que é punível ao interinos com a perda confiança e a revogação da Delegação.
Em face do exposto, o parecer que submeto à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido do provimento do presente recurso no sentido que o Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, Títulos, Documentos e Protesto faça o apontamento dos referido título e na falta de pagamento o Protesto, em razão dos fatos e fundamentos delineados nesta peça.
Sub censura.
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Documento assinado eletronicamente por Márcio Barcelos Costa, Juiz Auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça, em 21/07/2020, às 15:25, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. |
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Documento assinado eletronicamente por Desembargador João Rigo Guimarães, Corregedor-Geral da Justiça, em 22/07/2020, às 17:38, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. |